5.10.09

(im)parcialidade

Jornalismo costuma ser sinônimo de informação sem opinião: a apresentação "pura" dos fatos. E o jornalista, aquele que ouve e mostra todos os lados de uma questão. Oh, os jornalistas são quase deuses, ninguém os questiona! Se o jornalista falou - principalmente se for um Bonner da vida -, é porque é aquilo e ponto. Acho que os "meus leitores" não são desses [melhor se não forem, pois então poderão compreender melhor meu desabafo], mas vale lembrar que é esse o jornalismo mais presente no nosso dia-a-dia, que penetra em nossa formação quase por osmose.

Na academia, o que nos ensinam é bloquear palavras que indiquem qualquer sinal de opinião sobre seu texto. Adjetivos são proibidos para não agregar qualquer juízo de valor ao que é citado. Aí inclui-se, por exemplo, nunca colocar um político como mentiroso, corrupto, filho da puta e tudo mais aquilo que a gente tem vontade de dizer e que é até senso comum. Mas não, não podemos. Isso seria uma atitude vergonhosa e até motivo para uma demissão. A indignação transposta em exclamações e outros artifícios literários também já foram extintos para o bem da "imparcialidade". Dizem os professores que um bom jornalista apenas apresenta os fatos e o leitor/ouvinte/telespectador forma sua própria opinião a partir da "verdade".

Cortamos tudo aquilo que pode lembrar que tal informação está sendo produzida por alguém (que tem opinião). Não dizemos que somos contra uma greve ou um protesto. Simplesmente não noticiamos sobre isso, a não ser que esteja atrapalhando o trânsito ou o recebimento das suas correspondências, os pagamentos de suas contas. De forma nenhuma defendemos qualquer partido. Aliás, somos apartidários. Apenas editamos muito bem os depoimentos de candidatos, às vezes damos maior ou menor espaço a eles etc. Ao final, produzimos matérias sem qualquer vestígio de nós mesmos. Somos robôs fabricando a "informação" que só é capaz de manter nossas bundas bem acomodadas no sofá da alienação.

INFORMAÇÃO QUE MANTÉM AS COISAS COMO ESTÃO, QUE CONSERVA TUDO E TODOS EM SEUS DEVIDOS LUGARES. É O JORNALISMO CONSERVADOR. QUE ALIMENTA (ainda mais) A APATIA SOCIAL.

Apenas falamos o que está acontecendo, o que achamos que está acontecendo. E o pior: quando queremos ir além, somos impedidos por editores que devem favores a esse ou aquele, que defendem uma "linha editorial" específica ou que tenham qualquer outra desculpa pra impedir uma abordagem à nossa maneira, uma abordagem mais real do que enxergamos dos fatos.

Chega uma hora em que nem lembramos que temos (ou tínhamos) qualquer posicionamento. Escrever um texto opiniativo? É tarefa difícil até. Nos esvaziamos tanto de nossa opinião que até esquecemos que um dia ela existiu. Ficamos em cima do muro o tempo todo, afinal sempre há os dois lados, não?! Temos que ouvir o empresário que demitiu milhares de trabalhadores, ele com certeza tem algum motivo plausível pra isso. Temos que ouvir o que o presidente da república tem a dizer, afinal ele também tem a versão dele sobre o mensalão, os cartões corporativos e o raio que o parta! Coitado, não podemos julgá-lo. Seria uma acusação muito grave. [grave não é roubar dinheiro público, grave seria manchetar "Ladrões do povo estão impunes!" ou "Lula apoia roubalheira no senado!", por exemplo, seria um pecado, uma ofensa ao bom jornalismo!]

Me vem ao raciocínio uma contradição quase cômica. Lembro de uma definição para o jornalismo... de que ele deve falar pelo povo, que deve pensar pelo interesse público. "Ao fazer uma entrevista, pergunte em nome de seu leitor (supostamente o povo)", me recomendaram algum dia. Será que essas pessoas que nós "representamos" não têm opinião?

A informação pra mim tem que ter algum sentido. Escolhi jornalismo pra informar. Pra mudar. OK, diga. Ande! Diga-me que isso não passa de romantismo (utópico) da profissão! Direi que o jornalismo precisa ter algum sentido sim, que NÃO sou imparcial. Porque escolho um lado que julgo correto e o defendo até o fim. Bom, ao menos eu deixo bem declarado de que lado estou. Infelizmente, a contradição está em mim mesma, pois diariamente escrevo o que me mandam, não posso pôr em prática metade do que disse aqui até agora. Um sofrimento diário. E você... [também] anda enganando seus leitores?

(...)

Fiquei pensando nisso ao produzir uma reportagem sobre os trens da CPTM. Vou deixá-la aqui. A quem interessar, é uma das minhas raras tentativas (TEN-TA-TI-VA, pq, afinal, ainda me apego muito à imprensa aburguesada) de fazer um jornalismo mais próximo do que eu acredito, que tem algum sentido de mudança.

ps.: texto - Brunna e Murillo Diniz; imagens - Fernando Stankuns.




IMPORTANTE: sintam-se à vontade para fazer as críticas; gosto mesmo de polemizar, despertar o debate. vocês já devem saber disso... rs

3 comentários:

  1. NAO LI A MATERIA SOBRE OS TRENS, ASSUMO.
    MAIS ESSE SEU POST (SUA BLOGADA SEI LA O Q SE CHAMA FAZER ISSO) DIZ EXATAMENTE A SITUACAO Q VIVEMOS ENGANADOS POR FORMADORES DE OPINIOES...MOVIDOS POR UMA POLITICA "BARATA" (NAO SAEM DO BOLSOS DELES).
    A CIDADANIA NO BRASIL É UMA FACA!
    VIVA AS OLIMPIADAS RIO 2016!

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  2. "[grave não é roubar dinheiro público, grave seria manchetar "Ladrões do povo estão impunes!" ou "Lula apoia roubalheira no senado!", por exemplo, seria um pecado, uma ofensa ao bom jornalismo!]" - pronto, é isso.

    O jornalista só existe para grande mídia - e até algumas pequenas - porque computador ainda não aprendeu a escrever sozinho. ainda. E tem estudante [maioria] que se justifica que não tem espaço! Então, por causa de vocês, nos amontoemos todos - mas não eu, morro sozinho que seja, mas não abro mão de campos livres de percepção! [queria escrever mais mas tenho que sair ¬¬]

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